Seis anos depois da última edição, o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf) mostra que o Brasil segue estagnado em um dos seus principais desafios educacionais: 29% da população entre 15 e 64 anos ainda é considerada analfabeta funcional, o mesmo índice registrado em 2018. Isso significa que quase um em cada três brasileiros não consegue interpretar textos simples nem resolver operações matemáticas básicas em contextos cotidianos.
O levantamento, divulgado nesta segunda-feira (5), foi conduzido pela Ação Educativa e pela consultoria Conhecimento Social, com apoio de instituições como Fundação Itaú, Fundação Roberto Marinho, Instituto Unibanco, Unesco e Unicef. A amostra reuniu 2.554 pessoas em todo o país, entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025, avaliadas por meio de testes práticos e questionários.
Jovens com piora e trabalhadores em alerta
A pesquisa também revelou um dado preocupante entre os jovens de 15 a 29 anos: o índice de analfabetismo funcional aumentou de 14% para 16%. Entre os trabalhadores, o cenário também chama atenção: 27% são analfabetos funcionais, 34% têm apenas habilidades básicas e só 40% alcançam o nível mais avançado de alfabetismo.
“Estamos falhando na missão mais básica da escola: garantir que os jovens saibam ler, compreender e se transformar. Estamos matando a esperança e a dignidade de milhões”, lamentou Eduardo Saron, presidente da Fundação Itaú.
Alfabetismo estagnado e queda da EJA agravam cenário
A maior parte da população brasileira (36%) está no nível elementar, com domínio limitado de leitura e cálculo. Apenas 35% atingem o nível considerado proficiente, com capacidade para interpretar informações em textos, gráficos e resolver problemas com mais autonomia.
Para o coordenador de Educação da Ação Educativa, Roberto Catelli, a estagnação está diretamente ligada à queda nas matrículas da Educação de Jovens e Adultos (EJA), que em 2024 teve o menor número de alunos já registrado:
“Sem uma política pública efetiva de valorização da EJA, é difícil imaginar uma mudança nesse quadro”, afirma.
Qualidade da aprendizagem segue baixa
Segundo a superintendente da Fundação Roberto Marinho, Rosalina Soares, os dados do Saeb indicam que a maioria dos estudantes conclui o ensino médio sem níveis adequados de proficiência em Língua Portuguesa e Matemática, o que compromete a cidadania e o acesso ao mercado de trabalho:
“Não basta estar na escola, é preciso garantir aprendizagem de verdade”, ressalta.
Analfabetismo digital entra no radar e escancara nova desigualdade
Pela primeira vez, o Inaf avaliou também as habilidades digitais da população. Os resultados escancaram outra camada do problema: 95% dos analfabetos funcionais têm desempenho extremamente limitado em tarefas simples realizadas online. Mesmo entre os alfabetizados proficientes, 40% não foram bem nas provas digitais.
As atividades aplicadas incluíram:
- comprar um tênis em um anúncio online,
- conversar por aplicativo de mensagens,
- preencher um formulário para criar uma conta digital.
Os piores resultados vieram de pessoas com menor escolaridade: 96% dos que nunca frequentaram a escola ficaram no nível mais baixo. Mesmo entre quem completou o ensino médio, 15% tiveram baixo desempenho digital.
A renda familiar também influencia fortemente: entre os que se saíram melhor, 21% têm renda acima de cinco salários mínimos. Esse número cai para 3% entre os que tiveram baixo desempenho.
Retrato preocupante de um país desigual
O novo Inaf reforça que alfabetismo funcional e inclusão digital caminham juntos — e mal — no Brasil. A estagnação dos índices, combinada à desigualdade social, escancara o descompasso entre acesso à educação e qualidade da aprendizagem, e mostra que a simples presença na escola não tem garantido as competências básicas para a vida em sociedade.
Com informações da Agência Brasil