Portuário flagrado com cocaína fecha acordo raro com MPF e evita condenação

O destino da droga, segundo as investigações, era o porto de Luanda, em Angola.
Portuário flagrado com cocaína fecha acordo raro com MPF e evita condenação
Estivador foi preso em flagrante durante o trabalho (Foto: Polícia Federal de Santos/Divulgação)

Um trabalhador portuário detido por tráfico internacional de drogas após ser flagrado com 10 kg de cocaína no Porto de Santos, no litoral paulista, conseguiu firmar um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) com o Ministério Público Federal (MPF), o que resultará no arquivamento do processo e na manutenção de sua condição de réu primário.

O caso ocorreu em 26 de abril de 2024, quando agentes da Polícia Federal abordaram o homem a bordo de uma embarcação atracada no cais santista. Durante a ação, foram encontrados entorpecentes escondidos em uma mochila e sob suas roupas. O destino da droga, segundo as investigações, era o porto de Luanda, em Angola.

De acordo com a PF, o portuário atuava na movimentação de cargas e foi apontado como responsável por introduzir a cocaína no navio. Preso em flagrante, ele foi encaminhado à Delegacia da Polícia Federal e, em julho, teve a prisão preventiva substituída por medidas cautelares.

Redução de pena abriu caminho para o acordo

Apesar de o crime imputado — tráfico internacional de drogas — prever pena mínima de 5 anos de reclusão, o acusado obteve na Justiça Federal o reconhecimento do chamado “tráfico privilegiado”, que pode ser aplicado a réus primários sem envolvimento com organizações criminosas.

“O juiz acolheu nosso pedido e aplicou o redutor de pena previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas, diminuindo a pena abaixo do mínimo legal”, explicou Yuri Cruz, um dos advogados de defesa. A decisão abriu a possibilidade de propor o ANPP, já que um dos requisitos legais para o benefício é que o crime tenha pena mínima inferior a 4 anos.

Com a nova configuração penal, o Procurador Regional da República da 3ª Região, Silvio Pereira Amorim, ofereceu o acordo, homologado pela Justiça Federal em audiência virtual realizada na última quinta-feira (10).

“O cumprimento integral das condições previstas levará ao arquivamento definitivo do processo, sem qualquer registro de condenação”, destacou Cruz, que atuou no caso ao lado do advogado Marcelo Cruz.

Condições do acordo

Pelo ANPP, o acusado deverá prestar serviços à comunidade ou a entidades públicas por 4 anos e 10 meses, com possibilidade de conclusão em período menor — desde que não inferior à metade do tempo.

O acordo também prevê que o investigado abra mão de todos os bens apreendidos relacionados ao crime e que não esteja respondendo a outras ações penais. Caso se comprove o contrário, o acordo poderá ser revogado.

O advogado criminalista Guilherme Lázaro, especialista em Direito Penal e Processo Penal, ressalta que embora não exista proibição legal para o ANPP em casos de tráfico internacional, a medida é rara. “A pena mínima estabelecida para esse tipo penal costuma inviabilizar o acordo. Por isso, esse caso ganha destaque por abrir um debate sobre a flexibilização da aplicação do ANPP em crimes tradicionalmente considerados graves”, afirmou.

Segundo ele, a legislação exige ainda que o investigado confesse formalmente a prática do crime e aceite integralmente as condições impostas pelo Ministério Público.